Batalhas da II Guerra Mundial-Operação Barbarossa, a Invasão da Russia 3

  
Nas pegadas de Napoleão

Três caminhos levam ao coração da Rússia. Um deles margeia a costa do Báltico até Leningrado, a antiga São Petersburgo. O segundo, que Napoleão tomou em 1812, passa pelas velhas cidades polonesas de Minsk e Smolensk, até Moscou. O terceiro, situado ao sul dos Pântanos do Pripet, mas ao Norte dos Cárpatos, é a estrada que vai do Sul da Polonia até a região das terras negras da Ucrânia. O Pripet, uma área enorme, e quase impenetrável, de Pântanos de água doce e de florestas, divide a Fronteira Russa estrategicamente em duas metades distintas: a setentrional e a meridional. Os Cárpatos protegem as fronteiras da Hungria e da Romenia, mais que as da Rússia, e os seus cumes estão para Oeste da Fronteira Internacional. À parte o Pripet e os Cárpatos, a Rússia não está protegida contra Invasão, vinda da Europa, por quaisquer obstáculos naturais, pois, embora os três caminhos tradicionais de Invasão atravessem largos rios, é difícil garantir a integridade de uma linha fluvial nos enormes espaços da estepe.

Mas isso não quer dizer  que seja fácil invadir a Rússia. Dois geniais Generais, Napoleão e Carlos XII, o Rei Sueco, perderam ali a Reputação Conquistada em muitas Batalhas, e os horrores da retirada do Grande Exército de Moscovo em 1812 passaram a fazer parte do Folclore Europeu. Apesar de na época ser considerada um País extremamente atrasado, de economia desorganizada, dotada de pouquíssimas estradas, e muito ruins as existentes, a Rússia era tida como virtualmente imune aos perigos da Conquista. Schlieffen, autor dos planos de guerra Alemães no conflito que teve início em 1914, não tinha opinião diferente sobre aquele País. Entendia que os Soldados Alemães derrotariam os Russos completamente, apesar da desigualdade de números, mas os resultados jamais passariam do que ele chamava de “vitórias comuns”, isto é, vitórias nas quais o exército derrotado não é nem sitiado nem encurralado, mas apenas obrigado a abandonar o campo de Batalha. Ele dizia que o exército Alemão não conseguiria obter resultados decisivos na Rússia porque os exércitos Russos eram grandes demais para serem cercados e porque a paisagem Russa era destituída de obstáculos contra os quais se pudesse imprensá-los. Portanto, eles sempre escapariam e, assim fazendo, atrairiam o Invasor cada vez mais para dentro dos grandes espaços interiores Russos, onde o clima, a terra calcinada e o cansaço da perseguição acabariam por lhe solapar a força. Foi baseado nessas razões que Schlieffen trocou as vitórias comuns no Leste pela campanha contra a França, taticamente mais desafiadora, porém estrategicamente menos arriscada, marcando, dessa forma, o início de uma guerra de duas frentes.

Hitler herdou de Schlieffen todos os problemas de uma situação de duas frentes. Mas, inicialmente, tal como Bismarck, procurou conduzir o problema em termos Diplomáticos, e não Militares. Desse modo, surgiu o pacto Molotov-Ribbentrop de 19 de Agosto de 1939, pelo qual a Rússia e a Alemanha concordavam em não iniciar guerra de agressão entre si, e pelo qual também o território Polaco foi rachado entre ambas. Para Hitler, o tratado de não-agressão assinado jamais passaria de mero expediente. Não é provável que ele acalentasse motivos doutrinários para um ataque à Rússia; em quase tudo, exceto em seu antissemitismo, Hitler era completamente pragmático. Mas o bom senso lhe dizia que a própria magnitude dos seus sucessos, primeiro derrotando o exército Polaco, depois vencendo os da Bélgica, da França e da Grã-Bretanha, fatalmente alarmariam a Rússia, fazendo-a adotar medidas, não para aplacar a Alemanha pela reafirmação de políticas de não-agressão, mas acelerando sua preparação Militar. Sabemos hoje que Hitler estava errado a este respeito, pois durante todo o ano de 1940 e até o dia 22 de junho de 1941 a política de Stalin, embora compreendesse certas medidas defensivas, visava principalmente ao cumprimento meticuloso do pacto de não-agressão, aparentemente com espírito de facto apaziguador. Contudo, o sentido pragmático de Hitler lhe avisava que Stalin estava aproveitando o tempo, e se lhe permitissem ele alcançaria um nível de força militar que, empregado defensiva ou agressivamente, poderia ser demais para a Alemanha, no caos de um pega entre ambas.

A resistência continuada da Grã-Bretanha também enfatizava o perigo de uma inversão de Aliança por parte da Rússia. Hitler estava mais irritado do que perturbado com a persistente recusa da Grã-Bretanha em admitir a Derrota, já que o Reino Ilhéu estava evidentemente incapacitado para intervir no Continente. Mas a sua Antiga Tradição de Potência Marítima e a habilidade demonstrada nesse campo – a combinação da sua grande Marinha com um pequeno Exército contra os flancos costeiros da Europa – tornavam-na um factor que ele jamais poderia ignorar, mesmo quando o objetivo principal da sua estratégia sempre fora a Conquista de poderosos Aliados Terrestres. Rússia e Grã-Bretanha haviam feito causa comum contra a Alemanha na Primeira Guerra Mundial, como tinha acontecido contra Napoleão. Durante quanto tempo a Rússia resistiria à tentação de renovar esses laços? Se ela sucumbisse a essa tentação, Hitler se defrontaria com a possibilidade não de uma guerra de duas frentes, mas de três, já que o apoio Russo à Grã-Bretanha robusteceria as gestões do Presidente Americano no sentido de levar os Estados Unidos à guerra contra a Alemanha.

Mas não era preciso que as coisas seguissem essa sequência. Pois, “se a Rússia sair do quadro”, como Hitler explicou aos seus Chefes das Forças Armadas a 31 de Julho de 1940;

 “A Grã-Bretanha também perderá os Estados Unidos, porque a eliminação da Rússia aumentaria muito o poderio do Japão no Extremo Oriente. Decisão: a destruição da Rússia tem de ser parte dessa luta – quanto mais cedo ela for esmagada, melhor”. Foi com este argumento que Hitler convenceu a todos da necessidade de rapidamente planejarem a Blitzkrieg contra o Exército Vermelho.

Naturalmente, ele não levou em conta os preliminares do que ainda era uma operação de contingência; interferir na condução das relações normais entre as duas ditaduras, relações estas regulamentadas pelo pacto de Agosto de 1939 e por acordos subsequentes, celebrados sobretudo por Ribbentrop e Molotov, em Moscovo, em Setembro de 1939. Foi nos termos desses acordos que Stalin anexara os estados Bálticos, no começo de 1940, e a região Fronteiriça da Bessarábia com a Roménia, em Junho daquele Ano.

Hitler nada teria objetado se Stalin tivesse parado por aí. Mas a anexação, feita pela Rússia, de parte da Bucovina Romena, que estava fora do pactuado, deu a Hitler motivos para protesto e alarme. A Roménia, Aliado em potencial, sob a Liderança do Fascista Antonescu, era única fonte de petróleo natural da Alemanha. Hitler estava decidido a preservá-la a qualquer preço, e para tanto toda a atividade diplomática Germânica se desenvolveu no sentido de garantir os interesses da Alemanha na Região, ainda que à custa da posição Russa. A Hungria foi subornada com uma parcela do Território Romeno e a Roménia foi aplacada com o envio de Tropas Alemãs para proteger seus campos petrolíferos (garantia contra anexações que a Rússia viesse a querer realizar). Os Russos foram informados de que essas medidas se destinavam a repelir qualquer intervenção Britânica na região. Não obstante, Stalin assustou-se com tais iniciativas, como também com a Invasão da Grécia pela Itália, em fins de Outubro (que fracassou). Em meados de Novembro, enviou Molotov a Berlim, para obter garantias de boa-vizinhança, mas Molotov não obteve exito na missão. Se tivesse tomado conhecimento de que Hitler planejava uma rápida Campanha Balcânica para a primavera seguinte (“Operação Marita”), ele teria retornado à Rússia ainda mais inquieto com a situação nos Balcãs. Se tivesse, entretanto, adivinhado em que estágio se encontrava o planejamento da “Operação Barbarossa”, o codinome da projetada Invasão da Rússia, talvez nem se atrevesse a voltar, pois esse plano jogava por terra toda a política diplomática de sua pasta.
Hitler teria falado pela primeira vez da intenção de atacar a Rússia com o General Halder, o Chefe do Alto-Comando do Exército (OKH), a 2 de Julho de 1940 (dia em que deu ordem para a “Operação Leão-Marinho”, a Invasão da Grã-Bretanha). Hitler nunca pretendeu seriamente invadir a Inglaterra, talvez porque desconfiasse da impossibilidade de a Luftwaffe vencer o Comando de Caças da RAF, ou talvez porque já tivesse escolhido mentalmente a Rússia – e foi nos planos para a Rússia que ele se concentrou daí por diante. A explanação do plano foi feita ao chefe da seção de operações do seu próprio Estado-maior, o OKW, General Jodl (que seria enforcado em Nuremberga, pelo seu papel no “preparo e execução de guerra de agressão”). Este, por sua vez, ao explicá-lo aos seus auxiliares diretos, a 19 de Julho, provocou neles uma reação de descrença. Hitler havia incumbido Halder de preparar os planos, ordem esta que o Chefe do Estado-Maior do exército delegara ao General Erich Marcks. O plano de Marcks, apresentado a 5 de Agosto de 1940, fixava as linhas gerais que o plano definitivo de Invasão obedeceria.

Partia ele da suposição de que os Russos não atacariam os Alemães, embora fosse conveniente se o fizessem (Schlieffen fizera o mesmo juízo sobre os Franceses antes de 1914, erroneamente, como se viu), e que a Wehrmacht (as Forças Armadas alemãs) desfrutaria de pequena superioridade em número de homens, uma superioridade flagrante em unidades Blindadas e certa superioridade na qualidade do equipamento. Levando em conta a necessidade de manter guarnições nos Países ocupados, Marcks calculou que a Alemanha deveria pôr em campo 110 divisões de infantaria, 24 divisões Panzer e 12 divisões motorizadas, contra 96 divisões de infantaria russas (os russos chamavam Divisões de Fuzileiros), 23 divisões de cavalaria e 28 brigadas blindadas (os alemães ainda ignoravam o restabelecimento dos corpos e divisões mecanizadas de Timoshenko). Marcks destinaria o grosso das divisões alemãs e dois Grupos de Exércitos centrais, um operando de sul para leste, na direção de Kiev, capital da Ucrânia, o outro na direção leste, da Polonia para Moscou, ao longo da grande rodovia lateral que passa por Minsk e Smolensk, caminho que Napoleão e seu Grande Exército haviam seguido em 1812. Haveria duas operações subsidiárias: a primeira, um avanço sobre Leningrado, partindo da mesma base de operações do mais setentrional dos Grupos de Exércitos centrais; a outra, um avanço sobre Kiev, feito por forças teuto-romenas, operando pela Bessarábia anexada. Todavia, os Grupos de Exércitos centrais eram os que teriam de fazer o plano funcionar; uma vez alcançados os objetivos iniciais, Moscou e Kiev, respectivamente, eles avançariam rapidamente um sobre o outro e completariam o cerco de tropas russas a oeste deles. Este último objetivo era a meta principal do plano de Marcks. O Exército Vermelho devia ser cercado e destruído entre os rios Dvina e Dnieper, tudo dentro do período de nove a dezassete semanas.

Este plano, mais tarde muito emendado, lançou as bases da estratégia alemã para a “Operação Barbarossa”, em particular as do exército alemão (como veremos, as conceções estratégicas do exército e de Hitler mais  tarde vieram a chocar-se, com resultados dignos de nota). Não obstante, o “Plano de Marcks” ainda era mais um esboço de planejamento do que propriamente uma diretiva operacional, e, embora continuasse trabalhando nalguns problemas isolados, o Alto-Comando da Wehrmacht (OKW), o Estado-Maior de Hitler para planejamento e operações, passou a dedicar-se aos preparativos práticos. A primeira tarefa  era fazer a transferência de grandes forças do teatro de guerra ocidental para o oriental que, a 24 de outubro de 1940, atingiam o total de 35 divisões. Esta gigantesca transferência de todo um Grupo de Exércitos, um dos três que em maio haviam sido lançados contra os Aliados ocidentais, foi explicada às partes interessadas, que por certo incluíam os russos, como se se tratasse de, apenas, dar a essas divisões áreas mais amplas de treinamento do que as encontradas no Ocidente, ao mesmo tempo que as afastava do perigo de ataque aéreo britânico. Na verdade, certa redisposição de forças entre a França e a Polonia era perfeitamente explicável, em termos militares, pois com três Grupos de Exércitos – o grosso e a nata das suas forças de terra – destacados para o oeste, a posição estratégica da Alemanha estava seriamente desequilibrada.

Com o codinome Aufbau Ost, estes trabalhos preliminares foram satisfatoriamente realizados pelo OKW. Ao mesmo tempo, sua seção de operações preparava um estudo do ponto de vista estratégico do problema da invasão, a ser apresentado a Hitler. As conclusões a que ele chegou diferiam das do OKH: em lugar de recomendar a concentração do principal esforço ao longo do eixo Minsk-Smolensk, a estrada para Moscou, o OKW achava que o exército alemão invasor deveria ser dividido em três grupos mais ou menos iguais, dirigidos respetivamente contra Leningrado, no norte, e Kiev, no sul, bem como contra Moscou, no centro. Isto poderia parecer apenas uma diferença técnica de tratamento dos dois Estados-Maiores, não fosse o fato de o OKW também fixar que seus três grupos deviam manter contato permanente entre si, nos flancos, avançando em linha. Esta sugestão, embora protegesse contra certos riscos óbvios, certamente levaria o exército alemão à conquista de apenas “vitórias comuns” que Schlieffen relutara tanto em empreender havia trinta anos.

Entrementes, o Alto-Comando do Exército (OKH) passara o verão aperfeiçoando as linhas gerais traçadas por Marcks e, em fins de novembro, apresentou as conclusões a que chegara com a rigorosa lógica do “Jogo de Guerra”, um exército tático em grande escala e com mapas, um dos venerados métodos militares alemães de finalizar planos. Recomendavam, em suma, essas conclusões, conforme palestra feita por Halder, o Chefe do Estado-Maior do Exército, para uma plateia que incluía Hitler, uma fusão de elementos do plano original do OKH com elementos do plano do OKW, ou seja, um avanço com três Grupos de Exércitos, e não com dois, mais com ênfase no esforço para Moscou. O trecho principal da palestra de Halder foi o seguinte:

“Os centros de armamento russo mais importantes estão na Ucrânia, em Moscou e Leningrado. A área operacional será dividida em duas partes, norte e sul, pelos Pântanos do Pripet; na metade sul, a rede rodoviária é ruim; ao norte, as ligações rodoviárias e ferroviárias são melhores na área Varsóvia-Moscou. Este setor norte também está mais fortemente guarnecido de tropas soviéticas, agrupadas na direção de tropas soviéticas agrupadas na direção da linha de demarcação teuto-soviética (dividindo em dois a Polônia ocupada). O Dnieper e o Dvina são as linhas mais orientais que os russos têm de defender e um recuo maior desprotege suas regiões industriais. Teremos que impedir qualquer concentração de resistência a oeste desses rios, por meio da penetração de cunhas blindadas.

“Uma força de assalto particularmente poderosa terá de atacar de Varsóvia para Moscou. Dos três Grupos de Exércitos propostos, o setentrional estabelecerá seu ponto básico em Leningrado, o meridional em Kiev, e do último Grupo de Exércitos, um exército avançaria de Labun, outro de Lemberg (lwow) e um outro da Romênia. O alvo de toda a operação será o Volga e a região de Arcangel: 105 divisões de infantaria e 32 divisões Panzer e motorizadas (Panzergrenadier) seriam empregadas, com elementos fortes destas (dois exércitos) seguindo inicialmente na segunda leva”.
Com base nesta exposição, os dois Estados-Maiores, OKH e OKW, prepararam em conjunto a diretiva final. Ela foi apresentada a Hitler a 17 de Dezembro de 1940 e emitida apenas em nove cópias, supersecretas, no dia seguinte. Todavia, da noite para o dia Hitler alterou fundamentalmente o que os seus consultores militares haviam estipulado. A divisão de forças entre os três Grupos de Exércitos permaneceu intacta, bem como suas tarefas iniciais. Mas assim que os exércitos russos que defendiam a Rússia Branca (Bielorrússia – a região a leste da Polônia e ao norte do Pripet) tivessem sido destruídos, elementos poderosos do Grupo de Exércitos Centro seriam destacados para ajudar o Grupo de Exércitos Norte a apossar-se da costa do Báltico e de Leningrado. Somente depois de completada aquela operação é que se iniciaria o avanço que o OKH considerava decisiva.

Aí estava o ingrediente crucial da “Operação Barbarossa”, como Hitler passou a denominar oficialmente a Diretiva Operacional n° 21. Contudo, ela continha muitas outras coisas. O norte da Rússia seria invadido por um exército de montanha, operando da Finlândia, provavelmente em cooperação com o exército finlandês. O exército romeno, já efetivamente controlado pelos alemães, forneceria grandes contingentes para flanquear o avanço do Grupo de Exército Sul na direção de Kiev. A fronteira eventual do avanço alemão foi fixada na linha Volga-Arcangel, além da qual a “última área industrial que restava da Rússia nos Urais pode ser eliminada pela Luftwaffe, se necessário”.

Os efetivos dos três Grupos de Exércitos foram fixados. Integrariam o Grupo de Exércitos Norte o 16º  e o 17º Exércitos, de 18 divisões de infantaria, o 1º Panzergruppe, mais tarde chamado Exército Panzer; este contava com três divisões Panzer e três motorizadas, e era comandada pelo General Hoeppner. O Comandante do Grupo de Exércitos era o Feldmarechal Ritter von Leeb.

O Grupo de Exércitos Centro, comandado pelo Feldmarechal von Bock, era formado pelos 4º e 9º Exércitos, e mais 24 divisões de infantaria. Sua ordem de batalha completava-se com os 2º e 3º Panzergruppen, comandados por Guderian, o grande teórico dos tanques, e Hoth, que dividiam entre si 7 divisões Panzer e 7 divisões motorizadas.

O Grupo de Exércitos Sul, sob o comando do Feldmarechal von Rundstedt, o “Cavaleiro Negro do Exército Alemão”, consistia dos 6º, 11º e 17º Exércitos, dos 3º e 4º Exércitos romenos e do 1º Panzergruppe de Kleist. O 11º Exército e os dois exércitos romenos marchariam destacados do corpo principal, que se concentraria a leste de Lublin e Cracóvia, alinhados ao longo do rio Pruth, no extremo sul. A força total de Rundstedt atingia 31 divisões, das quais 5 eram Panzer e 3 motorizadas. Portanto, relativamente, ela era a mais fraca em blindados.

As divisões Panzer, em relação a 1939, eram menos numerosas, em termos de tanques. Isto se devia à formação de toda uma nova série de divisões Panzer, medida determinada pela retirada de quadros das divisões já existentes. Os resultados não foram de todo prejudiciais, pois os efetivos originais, em tanques, das divisões Panzer – quase 400 % eram altos demais, e muitos dos tanques (Mark II e mesmo Mark III e Mark IV), era um complemento melhor, quando contrabalançado por um volume bem maior de infantaria. Portanto, a nova composição de uma divisão Panzer  (Divisão Blindada, em 1941 era a seguinte: um regimento de tanques, de dois (às vezes três) Abteilungen, com 150 a 200 tanques; dois regimentos motorizados de fuzileiros (Schützen) (que em breve seriam chamados Panzergrenadier), de dois batalhões cada um, com os soldados transportados em veículos blindados de meias-lagartas, e um batalhão de reconhecimento de motociclistas. A artilharia, também motorizada, compreendia dois regimentos de campanha, um médio e um antitanque. O Q-G Divisionário controlava um batalhão de carros blindados de reconhecimento e uma pequena esquadrilha de aviões de observação. As divisões de infantaria motorizadas contavam com organização semelhante, embora, carecessem de tanques e tivessem um regimento adicional de infantaria. A função dessas divisões era acompanhar os Panzer e suplementar sua infantaria orgânica no ataque concentrado, ou sempre que houvesse muito trabalho de limpeza em bolsões de resistência isolados.

A quantidade de elementos mecanizados nesses dois tipos de formação os distinguia muito das divisões de infantaria comuns. O equipamento destas últimas praticamente não diferia do da infantaria do Kaiser, em 1914. Baterias de artilharia e escalões de suprimentos de primeira linha puxados a cavalo, batalhões de “pés de poeira” com pesadas mochilas – não era com estas formações que os alemães venceriam agora batalhas de cerco. Mas, como os acontecimentos de 1940, na França, haviam mostrado, era a velocidade alcançada pelas pontas-de-lança blindadas que contava na nova guerra, ao estilo alemão. Enquanto a infantaria garantisse a manutenção de um avanço regular de 30 ou 40 km por dia, os Panzer podiam correr o risco de avançar até 100 km. Nessas condições, só tinham de resistir por dois ou três dias nos locais atingidos, para que a infantaria, mais lenta, os alcançasse.

O término da concentração desta vasta coleção de divisões mecanizadas para a “Operação Barbarossa” estava marcado para 15 de Maio. Elas avançariam para leste em quatro levas. A primeira, quando a diretiva para a “Barbarossa” fosse emitida, estaria a postos. A segunda chegaria em meados de Março; a terceira, em meados de abril e quarta em fins de abril. Quando se chegasse a este ponto, já não seria possível disfarçar mais a importância do deslocamento. Mas antes que se completasse a concentração planejada, o desenvolvimento livre dos planos de Hitler para o teatro de operações do leste foi brutalmente interrompido por acontecimentos nos Balcãs. Em fins de Março, um grupo de oficiais nacionalistas e antinazistas do exército iugoslavo, liderado pelo General Merkovitch, derrubou a regência do Príncipe Paulo, pró-nazista, e denunciou a assinatura do “Tratado Tripartite”, que subordinava seu país à Alemanha, Itália e Japão. Hitler, que começava a impacientar-se com a falta de sucesso dos italianos na sua guerra particular com a Grécia, decidiu intervir direta e decisivamente nos Balcãs. Tropas que haviam sido destinadas à  “Operação Barbarossa” foram reagrupadas e realinhadas. Emitiu-se nova diretiva e, a 6 de Abril, teve início a campanha balcânica, de pequena duração.

A Iugoslávia capitulou a 17 de Abril; os exércitos gregos que lutavam na frente albanesa capitularam a 20 de Abril; o governo grego aceitou a derrota quatro dias depois e, nesse mesmo dia, a força expedicionária britânica enviada da África por Churchill, para ajudar os gregos assim que os alemães intervieram, começou sua retirada, em parte através da ilha de Creta, que caiu em mãos alemãs como resultado de dispendiosa operação aeroterrestre, a 26 de Maio.

Contudo, a campanha balcânica não resultou na transferência pura e simples de mais território para mãos alemãs. Esta – considerado particularmente o significado estratégico do território tomado – era bastante importante. Mas, de importância maior e mais crucial foi o atraso imposto ao início da “Operação Barbarossa”. Planejada para iniciar-se a 15 de Maio, só na segunda metade de junho poderia ser desfechada – um atraso de cinco semanas – semanas estas que, como Hitler e o mundo mais tarde reconheceriam, talvez tenham sido a diferença entre o sucesso e o fracasso para o exército alemão na Rússia. Cinco semanas é uma enorme parcela do curto verão russo.

O próprio Hitler, embora irritado com o atraso provocado pela campanha balcânica – e de início realmente enfurecido pela “perfídia” da Iugoslávia – não ficou de modo algum abalado por ela a ponto de decidir não prosseguir com seus planos. A “Barbarossa” deixara de ser uma imposição apensa prática, para transformar-se numa verdadeira obsessão. O codinome – o apelido de um imperador alemão que conduzira seus exércitos na Terceira Cruzada contra os eslavos pagãos, no século XII – deixa entrever a significação histórica que Hitler se atribuía, e opressiva e impiedosamente preparava o modo como se daria a sua revelação. Ele o transmitira a seus comandantes das forças armadas, num discurso pronunciado em março daquele ano:

“A guerra contra a Rússia se reveste de características que não podem permitir cavalheirismos: a luta é de ideologia e diferenças raciais e terá de ser conduzida de maneira implacável e inflexível. Todos os oficiais terão de se livrar de sentimentos obsoletos. Sei que a necessidade do emprego desses meios na guerra está além da compreensão dos senhores generais, mas... Insisto perentoriamente para que minhas ordens sejam executadas sem oposição. Os comissários (russos) são portadores de ideologias diretamente contrárias ao nacional-socialismo, tendo por isso de ser liquidados. Os soldados alemães culpados de violação do direito internacional... serão desculpados. A Rússia não participou da Convenção de Haia, portanto não tem direitos, nos termos da mesma”.

Para muitos, no exército alemão, tais sentimentos eram intoleráveis, mas nenhum deles esboçou qualquer reação. As ordens seriam, pela maioria, obedecidas dentro desse espírito. Para os oficiais das SS, do partido e do Estado que estariam envolvidos na administração e exploração do território russo capturado, o discurso de Hitler simplesmente deixava explícitos os planos que há muito eles vinham preparando. Nas suas mãos a Rússia viria a sofrer a morte, provocada por milhares de “pequenas feridas”.

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